Boas-vindas ao Maurício, e fiquem com primeiro texto.
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Gauchão aeternum est!

Confesso que ao comparar o Futebol gaúcho com uma tourada, não pude deixar de lembrar da farra do boi... mas apesar de haver a semelhança dos requintes de crueldade – embora a farra do boi não chegue a níveis assim tão hediondos – ainda não é esta a melhor comparação.
Um exemplo que pode vir a agregar na visualização é o seguinte: colocar um atacante bastante jovem, esguio e habilidoso para pelear num gramado do interior gaúcho, de preferência com chuva, é algo como a boa e velha prática romana de lançar cristãos aos leões. Apesar de existir uma possibilidade maior de o leão ter piedade ou não estar sedento por sangue.
Um zagueiro legítimo, macho e taura, está sempre sedento por sangue. Diz que há zagueiro que não contabiliza gols. Contabiliza carreiras encerradas.
O Campeonato Gaúcho é fogo.
Mas não só de ultraviolência vive o futebol destas paragens. Muito antes pelo contrário.
Inclusive há a tese de que um jogador ,quando desponta num dos grandes times daqui, só está pronto para o mundo depois de disputar pelo menos uma temporada do Ruralito. Se disputar e sair inteiro e não-desmoralizado, é craque.
Ou pelo menos serve pra alguma coisa.
E o que pode ser mais lindo para um povo de tradição tão guerreira, do que assistir no acanhado estádio de seu município, a equipe local – normalmente com sérias restrições no campo do tecnicismo e em outros campos também – resistir bravamente e muitas vezes jogar de igual pra igual com as poderosas, estruturadas e fortes equipes da capital?
E os torcedores dos times grandes do estado? Há espetáculo mais edificante, emocionante e comovente que, num Grenal decisivo no Beira-Rio, participar da horda colorada, do mar vermelho do Gigante e entoar heril canto que se avoluma a acusar os torcedores adversário de adesão a opção sexual pouco ortodoxa? Ou no Olímpico, participar da massa tricolor e bradar urros e cânticos a comparar os torcedores rivais a símios e, exaltada, relembrar glórias, títulos e láureas diversas?
Não. Definitivamente não. Não há espetáculo mais lindo do que este.
Mesmo que não tenhamos o futebol mais técnico – aliás, mesmo quando o que jogamos não é exatamente o futebol
Mesmo que não tenhamos o maior número de craques – muitas vezes, nenhum craque.
Mesmo que não tenhamos canchas com supérfluos, como gramado, por exemplo.
Mesmo que, em clássicos municipais, o número de faltas exceda – e muito, diga-se – o de passes acertados.
Temos, mesmo assim, o maior campeonato do mundo.
Conheça o Gauchão, este caso tórrido de amor e ódio, de ferro e fogo, de caos e paixão.
Gauchão aeternum est!
Maurício Kehrwald
Foto: terraportucallis.com