Buenos Aires de perto

Transcrevo abaixo um texto do blogueiro Túlio Bragança. Túlio é brasileiro e reside na Argentina há mais de um ano. Sou leitor assíduo do blog dele (há o link do blog também ali na seção "links extra-campo"), Aires Buenos, e já havia publicado outro texto dele por aqui. Além do bom texto, Túlio nos dá uma visão "brazuca" sobre o cotidiano do futebol platino, ainda que seu blog trate de temas variados, o futebol é tema recorrente.

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Estadio Ciudad de La Plata


"Ontem fui a La Plata assistir o jogo da Libertadores entre Gimnasia e Santos. O estádio, dito mais moderno da América Latina, realmente comprova o fato. Ganha da Arena da Baixada porque é maior e porque é completo.Os ingressos custavam apenas 5 pesos para a "hinchada" do Gimnasia e ZERO peso para a do Santos. Sim, num lugar onde geralmente é cobrado 50 pesos, as cadeiras, não pagamos nada. De santistas não havia mais que uns 20, 25 torcedores. Uns da máfia das torcidas organizadas fizeram dois brasileiros, um com a camisa do Sport e outro com a do Náutico, tirarem as camisas em respeito ao Santos. Eu, que estava com a camisa do Jabaquara, não fui importunado. Queria ver se mexessem comigo, não iria tirar mesmo a camisa. Preferiria levar um soco do cara, chamar a polícia e expulsar o delinquente do local.Esse é o terceiro jogo que vou aqui, já tinha ido em San Lorenzo X Santos e Boca X São Paulo. O fantástico é que mesmo um time tão inexpressivo com o Gimnasia possui uma torcida que coloca qualquer uma no Brasil no chinelo. Eles torcem de verdade e não cornetam. O time que praticamente passou a partida toda perdendo não perdeu o apoio da torcida em nenhum momento. O jogo, muito emocionante por sinal, acabou em 2 a 1 pro Santos. Um gol no comecinho do primeiro tempo para o Santos, o empate dos argentinos aos 43 do segundo e o gol da vitória santista aos 45.Tá na hora do brasileiro saber que torcer não é xingar nem reclamar.* a foto acima foi tirada na preliminar e por isso está tão vazio o estádio."

Por Túlio Bragança, do Blog Aires Buenos (
http://aires-buenos.blogspot.com/ )

Foto: do Túlio também, tirada por algum amigo dele, imagino (detalhe: na torcida do Santos).

É pênalti!

De: Maurício Kehrwald

A manhã estava ensolarada e tranqüila naquele domingo. Nem poderia ser diferente, afinal, em uma cidadezinha interiorana com tão poucos habitantes (menos de dez milhares, com certeza) não há grandes agitações e percalços, principalmente no dia estipulado para o descanso.


No entanto aquela situação estava para mudar um pouco, e isto era até que esperado, afinal, o glorioso Trevo Verde, no ano anterior, conseguira pela primeira vez em sua cinqüentenária história chegar à primeira divisão do campeonato estadual. E agora, na última rodada, lutava desesperadamente para evitar o descenso ao escalão secundário, de onde possivelmente levaria mais cinqüenta anos pra ascender.

A comunidade prometera mobilização massiva em apoio ao xantorubro, com direito a discurso do prefeito em praça pública e presença dos atletas. Todos numa corrente rumo à vitória e aquela coisa toda...

O dia foi passando, a hora do jogo chegando, a população entrando em polvorosa e lotando o Trevosão, como era chamado o pequeno estádio do município, com capacidade para duas mil pessoas sentadas. A maioria das pessoas levou cadeiras de casa mesmo, e, à hora do embate, sem atrasos, deu-se início à partida.

A equipe da Associação dos Plantadores de Fumo de Coronel Ambrósio – APFCA – como equipe visitante adotou um sistema de jogo visando contra-ataques velozes, mantendo-se postada defensivamente, enquanto o Trevo Verde bombardeava o gol.

Acabou o primeiro tempo, e o segundo foi passando, passando, passando... mas o placar continuava zerado. E não fora por falta de oportunidades. O Ataliba Guerreiro, torcedor-símbolo e ex-atleta da equipe da casa, contabilizara 28 finalizações para o seu time e 12 para “eles”.

Mas o tempo, que é implacável, passou. Aos 38 minutos do segundo tempo o placar continuava do jeito que começara. O desespero começou a tomar conta nas arquibancadas e cadeiras. Badalhoca perdeu um daqueles gols imperdíveis e o atacante da Associação mandou uma bola na trave.

O pânico era evidente, quando, aos 43 minutos, Medeiros paulista adentra a área a tropicões e é erguido pela zagueiro oponente. Pênalti! Pênalti! Pênalti! A torcida delira, o goleiro e artilheiro Palheiras chora. O êxtase é geral.

– É agora ou nunca mais – brada Ataliba Guerreiro.

Os jogadores do Associação cercam o árbitro a gritos beligerantes, trocam empurrões e os 2 policiais presentes, aplicando todo o preparo recebido para dispersar este tipo de aglomeração, dão leves golpes de tonfa (ou cacetete, ou porrete, ou P.R.) nas costelas dos jogadores do APFCA que obviamente se acalmam um pouco.

A torcida do Trevo Verde está radiante, grita, se abraça, chora, esperneia. O técnico da equipe corre pela lateral do campo e grita pro Palheiras – goleiro e artilheiro:

- Ô Palheiras! Vai bater!
- Podexá professor

E corre até o meio de campo, onde para, levando a mão à coxa expressando um semblante realmente sôfrego:

- Professor!
- Quê foi, Palheiras?
- Senti a lesão!
- Aquela?
- Aquela, professor
- Filho da puta!

A lesão em questão curiosamente aparecia toda a vez em que havia um pênalti decisivo a ser cobrado.

- Quem bate? Quem bate?
- (...)
- Medeiros Paulista, bata você!
- Não dá, professor, tô no sacrifício já!
- Câimbra de novo?
- É!
- Medeiros Gaúcho. Você é o capitão! Corre pra bater!
- Não dá!
- Ora, ta lesionado também?
- Não. Eu sou ruim mesmo. O senhor sabe que eu só tô no time porque marco bem.
- Bate bem, você quer dizer! – gritou um adversário que estava já com as canelas inchadas.
- Cala a boca, fresco! – respondeu-lhe o Medeiros Gaúcho
- Ta certo! Ta certo – o treinador estava começando a ficar estressado
- Ô Badalhoca!
- (...)
- Badalhoca! – Gritou mais alto
- (...)
- Cadê aquele corno do Badalhoca
- Ta no boteco comemorando, professor! – gritou o Ataliba Guerreiro, da arquibancada
- Comemorando o que? Não ganhamos é nada ainda!
- Ta lá! Ele sempre ta lá quando não ta aqui. – retorquiu-lhe o Ataliba.
- Ta certo... ta certo...

A torcida começa a ficar impaciente e o árbitro começa a consultar o relógio.

- Quarenta e nove minutos! Quarenta e nove minutos!
- Calma, calma! Alguém há de bater essa merda desse pênalti
- Eu bato professor!
- Quem é você?
- Sou o Zezinho, irmão do Badalhoca!
- Você nem do time é! E tem menos de 14 anos!
- Mas eu bato bem na bola, professor!
- Não dá, moleque, vaza! Nem inscrito no campeonato você está!

E seguiu a conclamação aos guerreiros do time:

- Arioswaldo, vai lá! Você pega forte na bola
- Nem.
- Nem o que?
- Nem vou.
- Ta machucado?
- Não
- Ta nervoso?
- Não
- Ta com algum problema mais sério?
- Também não
- Então...?
- Não to afim. Aliás, vou pro boteco que o Badalhoca ta me esperando...

E foi.

- Mas que time de merda que eu fui arrumar pra treinar! Quem bate? Quem bate?
- Eu bato professor!
- Cala a boca Ataliba. Teu médico te proibiu de chegar perto de uma bola de futebol!
- Mas, professor, eu nunca errei pênalti na vida.
- Também nunca acertou. Por que nunca bateu. Te aquieta aí!
- Professor, eu quero bater.
- Cala a boca aleijado dos infernos! Vai bater pênalti na seleção para- olímpica de velhos bêbados!

Ataliba Guerreiro fechou a cara magoado. Não considerava-se merecedor destas palavras grosseiras. Esse treinadorzinho pensava que era quem? Não sabia quem havia sido o grande Ataliba Guerreiro? Também não ia mais oferecer sua ajuda.

- Quem bate? Quem bate?
- Cinqüenta e cinco minutos... vamos logo com isso! – gritou o juiz
- Calma, senhor, calma! – pedia o treinador
- Professor, eu posso bater?
- Você bate, Sergipe Sergipano?
- Bato!
- Então vai lá
- Vou!
- Vai!
- (...)
- (...)
- (...)
- Ta fazendo o que aí parado?
- Tô com medo, professor! Não vai dar...
- Para de chorar homem...
- Não dá... se eu errar nós caímos...
- Ai meu Deus... eu treino um time de frouxos e de ex-atletas... Quem bate? Quem bate?
- Chama o alemão Günter! – gritou um das cadeiras (de praia, claro)
- O alemão! Isso! Cadê o alemão?

Günter chamava-se, na verdade, Heinrich Günter. Era filho de filhos de alemães e motorista do time e também da prefeitura. Além de fazer bicos como taxista. Havia sido inscrito no campeonato pois a federação exigia que ao menos 20 atletas fossem inscritos. E Günter fora um dos 5 atletas não – profissionais “utilizados” pelo Trevo Verde para o certame...

- Cadê o alemão? – repetia, aos gritos, o técnico
- Ta na van – berrou um lá da arquibancada
- Manda trazer! Diz pra ele calçar as chuteiras e chutar essa merda de pênalti logo que eu quero receber o meu e ir embora pra capital!

E foram chamar o Günter

- Professor?
- Fala, Günter, mete uma camisa aí, um par de chuteiras e cobra logo esse pênalti!
- Eu calço 48, professor!
- Puta que o pariu! Quem tem uma chuteira número 48?

Silêncio

- E 47? 46?

Silêncio

- Eu calço 43. Serve? – perguntou ingenuamente o Cidimar Capixaba
- Vou voltar pra van. – limitou-se a dizer o Günter
- Sessenta e dois minutos – gritou o árbitro da partida
- Bate logo que eu quero ir pra casa – bradou o goleiro da Associação
- Eu já disse que posso bater... – falou o Ataliba Guerreiro, a esta altura já dento de campo.
- Te arranca daqui seu pinguço fedorento! Vai lá beber a tua cachaça com o Badalhoca e com o Arioswaldo!
- Quê que tem eu profezssssor?
- Ari! Que bom que você voltou! Bate o pênalti?
- Bato!
- Bate?
- Bato!
- Ta, toma aqui a bola.
- Qual delas?
- Ai meu Deus!! Quem bate? Quem bate?

Nesse momento há uma certa impaciência geral, tanto por parte da torcida, como por parte dos jogadores de ambas as equipes, e, lógico, do juiz de jogo que insurgia verbalmente xingos variados.

- Ta certo! Cadê o repórter da Rádio Popular?
- Estou aqui, professor! – Respondeu prontamente o dito cujo
- Você ta inscrito no campeonato, lembra? Faltava gente e você aceitou ser inscrito.
- Mas eu não achei que fosse jogar...
- Não achou mas vai. Ele pode bater, senhor juiz?
- Tenho de consultar o fiscal de jogo – respondeu-lhe
- Pois consulte, por obséquio, que eu quero resolver isso logo

O árbitro consultou o fiscal que assentiu com a cabeça.

- Veste essa camisa, calça um par de chuteira emprestado e cobra a penalidade.
- Posso cobrar enquanto eu narro? Sempre quis fazer isso
- Não!
- Então eu não bato o pênalti
- Ta, pode narrar – esta frase saiu quase como um suspiro da boca do pobre homem
- Então está bem, espere aí que vou ali calçar umas chuteiras que eu trouxe.
- Você trouxe chuteiras?
- Claro!
- Mas pra quê?
- Ué! Como assim pra quê? Pra cobrar a penalidade, professor!

O “professor” preferiu nem perguntar nada. Queria que aquele pênalti fosse convertido, o jogo acabasse, ele recebesse a pecúnia que lhe concernia e haveria de desaparecer daquela cidade e tentar arrumar um trabalho na capital.

Talvez um cargo como auxiliar em um clube maior ou treinador de alguma categoria de base. Currículo ele possuía: havia trabalhado com a garotada da Portuguesa de Desportos e conseguido resultados edificantes. Passara também pelas categorias de base de algumas equipes do interior do Rio de Janeiro. Até títulos conquistara.

Agora estava ali, pela primeira vez dirigindo uma equipe “profissional” e não precisava de um rebaixamento para laurear sua estréia.

Foi interrompido de seus pensamentos, pelo árbitro:

- Setenta e três minutos do segundo tempo! Vocês estão de palhaçada. Eu vou acabar este jogo é agora! – ameaçou o árbitro
- Acaba o jogo e não sai do estádio – respondeu à ameaça um torcedor.
- Calma lá minha gente, o repórter já vai cobrar isso ai de uma vez por todas. – Disse, por fim, o treinador.

Volta, devidamente fardado, o repórter. Sorrindo e já narrando sua entrada em campo:

- E adentra-se pelo campo o atleta de nome Carlos Camargo... tem a magnífica tarefa de efetuar o tento máximo da história do glorioso e inexorável Trevo Verde...
- Cala a boca filho de um corno com uma jumenta! Bate logo esse pênalti e vamos embora daqui!
- É! Vamos com isso que eu quero comer minha quentinha no ônibus! – Ganiu, soerguendo a voz, o goleiro do time visitante.

A torcida volta a acomodar-se. Reservas entraram nos lugares dos que desertaram rumo ao bar (no caso, o Badalhoca e o Arioswaldo, que, apesar de ter regressado ao campo, re-regressara ao boteco). Nos seus respectivos lugares: Nelsidor e Vítor.

Silêncio sepulcral. O batedor toma posição. Narrando, ainda.

- E Carlos Camargo prepara-se pra cobrança... espera o apito do árbitro.
- Priii!
- Apitou, correu Carlos Camargo pra bola...

Parou.
Silêncio.

Camargo vira-se para a comissão técnica (no caso, o treinador da equipe) e diz, tétrico:

- Professor... não dá! Acabei de lembrar que meu falecido pai trabalhou plantando fumo em Coronel Ambrósio. Inclusive foi membro-fundador da Associação. Não posso fazer isso com ele... sinto muito.
- Era só o que me faltava! Outro frouxo impotente! Pelo amor de Deus, quem bate essa penalidade?

Silêncio

- Nelsidor?
- Sim?
- Bate o pênalti
- Eu sou reserva do Trevo, professor... que qualificação terei eu pra comprometer-me em empreitada de tamanha relevância para a comunidade, no âmbito esportivo-social...
- Fecha a matraca! E volta a dar aula de comunicação, porque pra futebol você não serve!
- (...)
- Vítor!
- Senhor?
- Você é minha esperança. Você é um tetracampeão de Libertadores da América. Já foi campeão do mundo duas vezes. Tem bagagem e experiência... por favor, dê esta alegria à torcida do Trevo Verde.
- Ta certo, professor... só que tem um problema.
- Qual seja?
- Só bato quando pagarem os atrasados.
- Mas, Vítor. A direção pagará assim que o campeonato acabar, ou seja, daqui a, no máximo, 5 minutos!
- Antes quero ver a cor da grana. Se eu não receber, não tenho como comer, e sem comida o peão não vive.
- Mas você não tem guardado o dinheiro da época em que estava no auge?
- (...)
- Quem bate? Quem bate?
- Oitenta e dois minutos... – murmurou o juiz, quase chorando de raiva. – Eu tenho família também. Amanhã cedo trabalho numa escola. Sou professor de Educação Física...
- Ninguém quer saber o que você faz! – Gritou o Ataliba Guerreiro
- Quem bate? Quem bate?
- Palheiras, como ta a lesão?
- Ta dolorida!
- Mas dá pra bater?
- Não dá!
- Ai meu Jesus amado... quem vai bater?
- Eu disse que bato, você é quem não quer. – Vociferou o Ataliba Guerreiro
- Já não te mandei calar esse bico seu indigente, mendigo e fracassado?
- Ta certo, não vou mais tentar ajudar... mas eu sei quem poderia bater...
- Você, né? – Riu ironicamente o coach
- Fora eu.
- Quem?
- Não importa. Eu não era um mendigo, indigente, fracassado, bêbado e ladrão?
- Não te chamei de ladrão.
- Não?
- Não.
- Ah, certo... (visivelmente encabulado)
- Por favor, senhor Ataliba, quem poderia cobrar esta penalidade máxima a nosso favor?
- Você! – respondeu, cuspindo pipoca por entre os dentes, o nosso Guerreiro.
- Eu?
- É! Na falta de atleta eu soube que o senhor se inscreveu no campeonato
- Certo mas... mas... eu... eu não bato pênalti...

E, na falta de uma desculpa bem arranjada, e, sob olhar acusador da massa presente, percebeu que não haveria remédio. Teria de cobrar ele mesmo.

Acontece que ele nunca havia jogado futebol na vida, fora, claro, umas peladas esparsas quando jovem... no entanto era um aficionado pelo esporte. Acabara conseguindo um emprego na escolinha de um colégio em São Paulo assim que saíra da faculdade. E acabara conseguindo certa notoriedade “pagando uma de boleiro”.
Seria desmascarado. Certo. Mas também não podia ser tão difícil assim acertar uma bola longe do alcance do goleiro, e dentro daquela imensidão absurda que é uma trave de futebol de campo.
Amarrava as chuteiras lentamente, esperando que algum fenômeno ocorresse e esta tarefa fosse tirada de suas mãos – na verdade, pés – e transferida a outra sôfrega alma ali presente.

Calção vestido, camisa posta, meião erguido, chuteira amarrada. Como nada mais faltava, caminhou, pois, até a marca da cal.

Já havia tomado a distância e decidido que era canhoto – afinal ,escrevia com a esquerda, pois chutar bola, mesmo, nem lembrava com qual pé chutava, se é que chutava.

Concentrava-se no canto onde chutaria a bola (o meio), e já preparava uma “lesão” para o caso de errar.

O árbitro sorria um sorriso sádico e estava já em vias de apitar quando, como um último lampejo de esperança, o inefável Ataliba Guerreiro interrompe o ato:

- A quem interessar possa, o jogo entre o Palmeirense e o Campo das Pedras acabou empatado.
- Sim, e eu com isso? – berrou irritadíssimo o treinador-batedor-mártir do time xantorubro
- E daí que o empate lá, rebaixa o Palmeirense e salva o glorioso e esse outro timeco aí do rebaixamento

O capitão do Associação quis protestar quanto ao “timeco” mas preferiu ver onde que aquele circo ia dar.

E o Ataliba continuou.

- O Silveira Serrano já estava rebaixado. E com este empate o Palmeirense fica com o mesmo número de pontos dos dois times que estão jogando aqui... basta um empate pra livrar ambos do buraco.

O rosto do batedor alumia-se, apesar de ser já quase noite, e, dirigindo-se ao todo:

-Alguém aqui se importa com o Palmeirense?

Silêncio

- Alguém aqui ta filmando essa merda toda?

Silêncio

Olha reto para o repórter de campo, que lhe responde bruscamente:

- Ninguém ouve essa bosta mesmo.

E, finalmente, para o juiz da partida:

- Vamos embora daqui?
- Sim, e ligeiro.

Pega a bola em mãos, para o cronômetro, que já marcava quase 100 minutos de jogo, levanta o braço e...

- Priiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii

Aí foi só alegria. Até os jogadores do Associação participaram da festa, e, mais tarde, as comissões técnicas mais os jogadores de ambas as equipes (exceto o comandante da equipe do Trevo Verde, que saíra às pressas após receber seus atrasados) chegaram ao boteco, pra comemorar, e mais tarde juravam...

...que o Badalhoca ainda estava ali.

Os dois lados da moeda

É engraçado como as coisas se modificam conforme onde está o "observador" como diria o pessoal das ciências sociais. Mas mais ainda que quando observador, quando participante de uma maneira ou outra de eventos, competições, jogos, etc.

Por um lado, sou brasileiro, e acompanho o futebol da Seleção Brasileira em competições importantes como torcedor brasileiro. Sejam em Copa América (quando saem interessantes) ou em Copa do Mundo. De resto a Seleção não me chama a atenção, por causa de outros tantos fatores, mas amistosos em meio a nada (em termos competitivos) não me agradam mesmo. Pode ser até contra a Argentina.

E é a Argentina que usarei como exemplo, de um dos lados da mesma moeda (para fazer jus ao título). Estamos acostumados, consumidores de informação, a ler, ouvir e reproduzir que a Argentina (falo em termos de clubes, principalmente) tem times "tradicionalmente" catimbeiros.
O "tradicionalmente" aparece nestes textos e discursos para não parecer que há uma generalização barata e o catimbeiro é eufemismo muitas vezes, para não dizer que os times argentinos, de maneira geral, batem mesmo e são muitas vezes desleais em jogadas divididas. Alguns locutores e comentaristas até afirmam abertamente, mas normalmente ficam no "tradicionalmente catimbeiro".

Claro que pelo lado argentino, eles também têm suas reclamações com o Brasil e talvez uma delas seja essa: a falta de reconhecimento quando há uma belo futebol, ou apenas o reconhecimento esporádico por uma ou outra jogada ou vitória. Há arte também no futebol platino, seja catimbando ou não.

Mas vivo o outro lado da moeda, mesmo sendo brasileiro. Pois além de brasileiro sou gaúcho. Já vi e li algumas acusações, mais brandas, claro, contra os times gaúchos, semelhantes às usadas contra a Argentina.

Mas além de gaúcho, sou de Bagé e além de ser bageense (ou bajeense, segundo a norma) sou torcedor do Bagé. Então nestas semanas de início de Série B do Gauchão, a qual meu time freqüenta desde 1995, me vejo lendo o discurso que muitos argentinos devem ter lido, assistido e ouvido, e que vinha do Brasil.

Então notei uma coisa: os argentinos devem fica extremamente irritados com as acusações de anti-jogo. Diria até que podem ficar chateados mesmo. Porque quando tu assistes a um jogo de futebol, vê uma partida de marcação forte, ríspida, mas sem jogadas desleais, é muito irritante abrir jornais, sites e comentários nos dias seguintes e ler um monte de acusação de "antijogo" por gente que até nem acompanhou a partida, mas fundamenta a análise no histórico do time (na visão deles "folha corrida").

Nestas semanas de início de segundona, com o outono se aproximando, eu já conheço demais este ambiente, lá vem o velho Bagé de novo, mas com ele os velhos discursos sobre a violência do time da fronteira. Não estou escrevendo que sejam santos ou o time da Associação Cristã de Moços, mas o que é estranho de acompanhar é a utilização de uma imagem pré-estabelecida para atingir fins vantajosos, em bom português: cartões, muitos cartões.
Por isso, os dois lados da moeda. E assistindo a tal partida que é motivo de debate em tal site, e lendo as opiniões, baseadas apenas em coisas pré-concebidas, que não assistiram ao jogo, mas acham demais que tal resultado se dê sem uma explicação que passe pela violência e antijogo, me senti um pouco como imagino que se sintam os argentinos. Mesmo quando o time joga bem, com poucas faltas, o que vale é o status adquirido, pro bem e pro mal.


Foto: Mj Vasquer via Flickr

(peço desculpas pela ausência de postagens, mas não posso prometer maior freqüência devido a absoluta falta de tempo. mas espero que os intervalos sejam menores, certamente)



UEFA Champions League 2006/2007

Rodada sensacional a de hoje pela Champions League.
O Bayern jogando em casa contra o Real Madrid, abriu o placar logo aos 11 segundos, após roubada de bola. Parecia que seria goleada, mas não aconteceu. Lúcio ampliou no segundo tempo, de cabeça, mas ainda assim não veio a tranqüilidade, porque o Real Madrid descontou de pênalti aos 40 do segundo. A partir daí esqueçam esquemas táticos, foi chute pra longe do Bayern e no Real até o goleiro Casillas subiu num escanteio para tentar o cabeceio. Mas ficou no 2 x 1 pros alemães, que por marcarem mais gols fora de casa na primeira partida (3 x 2 pro Real Madrid), levaram a vaga para as quartas.

Já o brioso Celtic (simpatizo muito com este clube, arrisco a dizer que é "meu time" na Europa), segurou o 0 x 0, e levou a decisão para a prorrogação contra o Milan, na Itália.
Só que logo aos 3 da prorrogação, Kaká aproveitou contra-ataque (sim, o Celtic cedeu um contra-ataque, e foi fatal) e tocou na saída do goleiro, rasteira. Terminou ali, seguiu o Milan.

Desta rodada, além dos classificados, ficou o saldo de dois jogadores com o nariz quebrado. O primeiro, o jogador Chivu (ao lado), do Roma, após cotovelaço do atacante Fred, do Lyon (Fred nega a intenção, ainda mais que além das meias, estava de chuteiras). O segundo foi Burdisso, da Inter de Milão, após entrevero com Navarro, do Valência. Aliás, sobre este jogo, vimos cenas incomuns para uma UEFA CL. Briga no final, correria e tentativa de invasão de vestiário. Fora um "carrinho" sensacional que acabou não atingindo o alvo. No interior chamamos de "em seco", quando estes golpes não acertam. Coisa pouca, mas como foi nos gramados europeus, a repercussão é imensa.
Abaixo o vídeo do final do jogo. Os brutos também amam...neste caso a frase tem o sentido inverso, ou quase isto.


Dois detalhes do vídeo:
1. O Valência tem um ótimo fundista mal aproveitado (o que escapou do "carrinho").
2. A felicidade do garoto oriental, logo no começo do vídeo, ao visulumbrar o embate.









Foto 1: Terra Esportes
Foto 2: Globo.com

Começa a Série B

Por aqui já começou a Série B do Gauchão.
O Bagé estreiou com vitória em casa, placar típico, 1 x 0 frente ao clube de futebol mais velho do país, o SC Rio Grande e os fundamentais três pontos na estréia. Ouvi o jogo pela Rádio Cassino, de Rio Grande, e adivinhem a reclamação da gente do "vovô"?

-"Como sempre aqui um jogo de muita catimba e anti-jogo...dos 45 minutos finais, se foram 15 de bola rolando, foi muito".


Ora, que culpa tem o Bagé se o gol saiu aos 39 da primeira etapa? Acabou o jogo.


Hoje de noite, completam a rodada da chave 4, Pelotas x 14 de Julho e São Paulo x Farroupilha.



Foto: Jornal Correio do Sul (Bagé -RS)
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