Tchê bagual, perdi meus brinco!

Uma das especialidades humanas é usar, sempre de acordo com a situação, de maneira conveniente, sentenças, frases de efeito e conceitos. A utilização não é reprovável, o que causa estranheza é ver o pensamento exatamente ao contrário, quando mudam as circunstâncias.

Em jogo válido pelo Gauchão, no último domingo, Willian Magrão sofreu
séria lesão no joelho. A extensão da lesão só foi conhecida nesta segunda-feira, acabando na imprensa, e nela e nos fórum da rede, centenas de torcedores emitindo opinião.
Uma parcela de torcedores, não pequena, imputa como culpado pela lesão, o próprio Gauchão.

Campeonato já tachado de tudo, que muitas vezes serviu de "salva-temporada", desta vez é atacado no âmago: na rispidez (ou violência, conforme quem escreve) dos seus jogos. Agora já não é só intitulado de "cafezinho", "ruralito" (apenas em anos em que disputam Libertadores no 1º semestre, ou ao final do semestre, quando a Copa do Brasil já está decidida). Neste momento, para muitos, o ruralito também é a causa desta e de outras contusões, em virtude de sua suposta virulência ( a escala também muda conforme a circunstância).

Há alguns anos atrás, o escritor Luis Fernando Verissimo perguntava em sua coluna na Zero Hora, de onde tiravam (a concepção) este "estilo gaúcho de jogar", se a maioria dos jogadores da dupla Gre-Nal (como hoje), era oriunda de fora do Rio Grande do Sul? Respondi por e-mail que este estilo era justamente adquirido, mal ou bem, no Gauchão (principalmente em décadas anteriores), e que mesmo jogadores de fora do Estado, acabavam por entender o que era o jogo mais marcado, mais brigado, ainda que a técnica seja mais que bem-vinda, desde que objetiva. Era uma exigência do jogo, uma espécie de seleção natural para se dar bem nos campos do sul.

Além disso, todos os times do Rio Grande do Sul orgulham-se de serem times "raçudos" (se bem que todos os torcedores de todos os times do Brasil devem praticar este discurso, ao menos para consumo externo). Mas no caso sul rio-grandense a coisa se agigantou. Orgulha-se e exige-se isto.
Vários outros cronistas esportivos afirmam que isto beira à falácia, principalmente aqueles que só têm olhos para a dupla Gre-Nal, argumentando que o futebol competitivo é assim no mundo todo.

De qualquer maneira, mesmo os torcedores oriundos da "Mui valorosa e leal" (título concedido à Porto Alegre pelas resistências aos cercos rebeldes, quando da Revolução Farroupilha - pra quem não é do RS -) adotaram este gosto. Desde que (quando) fosse a favor: vitórias épicas, jogador adversário quebrado, ordens de "mandar bater", etc. Um orgulho só. "Ah, eu sou gaúcho!".

Agora neste caso específico, por exemplo, em que um jogador do Grêmio se contundiu seriamente no interior, aparecem várias manifestações contra o fato do Grêmio disputar o Campeonato Gaúcho. Argumentos como: "O Gaúchão só serve para aleijar jogador"...."jogar nestes potreiros só pode dar nisso", "várzea das várzeas", e por aí vai.

Neste pensamento, e apenas nestes casos, quando se sentem prejudicados, o Gauchão é um atentado contra às equipes da dupla Gre-Nal. Acaba-se a "raça" gaúcha. Todos são açougueiros invejosos, independente que a lesão tenha sido mera fatalidade ou não.

Este é um dos problemas das coisas artificiais. Criadas pelo discurso, pelo marketing, oficial ou não, torna-se confuso, evasivo. O torcedor comum, longe dos discursos, não sabe para onde atirar. Exemplificando com um fato de anos atrás, Porto Alegre é tão longe do interior, futebolística e culturalmente falando, que conseguiram achar estranho o termo "borracho". Uns acharam que estavam trazendo algo novo pra suas faixas, estrangeiro; outros achavam que isto era pura cópia estrangeira. Fácil de entender, já que o termo realmente é um estrangeirismo artificial em Porto Alegre. O difícil era explicar pros gaúchos torcedores de Grêmio e Inter espalhados pela fronteira sul, sudoeste e oeste, o motivo de toda aquela celeuma, já que pra estes, o termo é comum no cotidiano, entre vários outros.

Vai no mesmo caminho o que quero dizer sobre o começo do tema. Para um torcedor de Porto Alegre, o que ocorre em jogos do interior, quando seu time é prejudicado (raramente) de uma maneira ou outra, é culpa do barbarismo dos nativos locais dentro de campo. Mas é neste barbarismo que se abraçam, para forjar uma identidade que nunca os pertenceu totalmente. Mas aí é chamado de "raça". Nos momentos em que conquistaram algo baseado nesta concepção de "futebol gaúcho" esquecem onde foi que afiaram as esporas, que apesar de miúdas, neste caso, e de destoarem do contexto deles, ainda eram esporas.

De todo modo, ainda restam algumas alternativas para não serem atingidos pelo "barbarismo" interiorano:
- jogar com juniores (recentemente sugerido por um dirigente, por outro motivo insólito);
- jogar com juvenis ;
- simplesmente não disputar o Gauchão, em acordo entre os dois grandes;
- jogar vôlei;
- disputar o campeonato baiano.

E depois, tendo dignidade, não reclamar que faltam amistosos ou jogos, quando enfrentarem o valoroso combinado da Ortopé.

3 comentários:

Maurício Alejándro Kehrwald disse...

Sim George, mas esse tipo de reclamação SÓ vem de pessoas como:

a)dirigente neófito de outro dirigente com tendências histéricas e possível homossexualismo-passivo-agressivo;
b)jogador de "estadual mais charmoso do Brasil";
c)aquele torcedor que já perdiu o tino e a capacidade de dissernir os fatos do futebol - e seus filhos que repetem os ensinamentos.

Refugar gauchão é coisa de cagado.

E digo mais: se a FGF tivesse CULHÃO, implantaria um sistema NAZISTA e aplicaria MULTA PESADA a cada vem que um dirigente, técnico ou jogador falasse alguma abobrinha ou desvalorizasse o certame.
Democracia é pra otário.

George disse...

Concordo.
Daria pra fazer mais coisas, que inclusive valorizaria o Gauchão, e o tornaria menos dependente do humor da dupla.

Felipe Z, disse...

Complementando o que foi dito pelo Maurício, desprezar o gauchão é coisa de guri de apartamento espinhento criado pela vó.

Outra coisa que eu fiquei muito indignado foi quando uma piazadinha desocupada encheram de críticas com a realização do grenal no interior. Pior eram argumentos como: a sede é em Porto Alegre, tem que fazer grenal em Porto Alegre. Ou adjetivos como grenal funai.

Postar um comentário

top