Estádios Singulares

Nas duas postagens mais recentes do Puro Futebol, Túlio e Maurício falavam um pouco sobre estádios. Aproveito o mote desta semana.

Sou de uma cidade que tem como particularidade um futebol de várzea muito pujante. Historicamente em Bagé, o futebol de várzea atrai muitos times e jogadores. Para terem uma idéia, em Bagé há a Taça de Ouro, Taça de Prata e Taça de Bronze. Todas as 3 com 20 times. E tudo levado muito a sério. Há contratação de jogadores e treinadores, com várias moedas de troca, e inclusive torcida, além dos familiares dos jogadores. Uma das demonstrações de força do público destas equipes, é que quando há jogos profissionais importantes em Bagé, negociam com a Prefeitura e clubes amadores, a transferência da rodada do amador, para que mais gente compareça ao estádio.

No que tange ao pitoresco (poderia dizer folclórico, mas é realidade) muita coisa já aconteceu nos gramados de Bagé, e eu não seria o melhor relator dos eventos, já que pouco acompanhei o futebol amador da cidade, a despeito de meu pai ter sido treinador de algumas equipes tradicionais dos certames varzeanos. Mas há histórias sensacionais. Se algum dia recuperar alguma delas, escreverei por aqui.

E a maioria destes times, representa bairros e vilas. Em Bagé há o segundo maior ginásio do Estado, o "Militão", e ao redor do estádio existe um complexo de campos de futebol (6 ou 7 campos com medidas oficiais), administrado pela prefeitura. A infra-estrutura é boa e lá são realizados muitos dos jogos amadores. Mas vários destes times também tem seu próprio "campo". E alguns têm peculiaridades incríveis. Cito apenas dois porque são os que estão mais vivos na memória: o do Unidos (meu pai treinou este time) e um na Vila Ipiranga, que não lembro que time (ou times) o utiliza.

No campo do Unidos, há uma "caída" para uma das metas. Melhor explicando, o campo tem uma inclinação de uns 30 graus...espero não estar exagerando para menos. Imaginem as inúmeras alternativas de estratégia que este fato oferece. Se atacares "na subida" no primeiro tempo, melhor deixar os jogadores mais desgastados entrar na segunda etapa.... Ou numa cobrança de falta: o jogador que bate com qualidade, mas tem menos força, bate as faltas quando forem contra a goleira da "baixada", por exemplo.

No campo da Vila Ipiranga, não precisa explicar muito: uma linha de trem era praticamente a demarcação da linha de meio campo. Imaginem o esforço dos jogadores para transpor o obstáculo, e as estratégias que a partir desta presença no gramado eram definidas.

Apesar destas dificuldades, os times amadores sobrevivem, e em todos finais de semana estão nas canchas espalhadas pela cidade, trazendo entretenimento e uma alternativa barata de diversão, que inclusive o participante pode ser protagonista. Este é um dos segredos do sucesso do futebol: tirando extremos, um campo é um campo em qualquer lugar do mundo (as medidas são flexíveis, inclusive), uma trave é fácil de fazer, as linhas são demarcadas com cal, etc. Na verdade, o maior problema mesmo, e que difere um campo de outro é o que está na volta, o que chamamos de estádio. Mas a grosso modo, futebol se joga em praticamente qualquer lugar, e o melhor: dentro das regras oficiais. Por isso a FIFA é tão relutante a certas mudanças (que incluiriam a necessidade de equipamentos eletrônicos, principalmente).

Pois a Federação Gaúcha de Futebol, a partir de 2009, vai exigir dos clubes participantes da Série A do Gauchão, estádios com iluminação artificial e capacidade mínima de 5000 torcedores.
Por um lado (o racional) entendo e apoio a medida. Porque se num primeiro momento isto impede alguns times de participarem, logo adiante todos estarão cumprindo esta exigência, as comunidades se mobilizarão ,tenho certeza e teremos melhores estádios.
Por outro lado, estarão mudando para sempre certas características do futebol do interior e do futebol gaúcho. Além do futebol enérgico, o interior com seus campos singulares sempre foram motivo de dificuldades, e neste sentido fazem parte da estética do Gauchão. Não que mudarão muito, mas já serão diferentes.

Futuramente a medida será saudável para todos os times, é claro, mas já registro a nostalgia dos velhos campos de guerra do interior.

Na foto, o estádio do Rampla Juniors (Montevidéu, Uruguai) que tem como peculiaridade ser contornado pelo Rio da Prata. Então quando a bola é chutada para fora dos domínios do estádio em direção ao rio, já há um bote com a missão de "pescar" a bola. Sensacional.

1 comentários:

Maurício Alejándro Kehrwald disse...

Bah,interessantíssimo y puro!
Nada mais fascinante que os periféricos do jogo (e, neste caso, literalmente).
Cuando a visitação aumentar, sugiro uma série com os piores estádios do futebol gaúcho.

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