Histórias do Futebol IV - O Flamengo de Bagé

Para tentar explicar esta história mais ou menos bem, tenho que comentar o motivo da minha lembrança. O Maurício, blogueiro que sempre comenta por aqui, escreveu no blog dele sobre humores e outras histórias. Na história dele, um cara vai ao campo carregando um '38 na cintura. Lembrei direto dum jogo no Flamengo.

Explicando mais um pouco: o Flamengo é um clube social tradicional em Bagé. Possui ginásio, salão de festas, etc. Um belo patrimônio, apesar de nunca ter se aventurado no futebol profissional. E na verdade, este clube foi fundado por ferroviários (categoria que era muito forte em outros tempos), e até hoje lá freqüentam descendentes dos fundadores. Entretanto o clube aluga a quadra (ginásio) para quem quiser bater uma bola por lá, ainda que não sejam sócios. Que fique claro: isto nada tem a ver com os ilibados sócios do Flamengo ou com a instituição. Mas a energia que rolava no ginásio quando o nosso time estava por lá, é interessante. Geralmente acabava em briga.

Numa noite de sábado, alugamos a quadra e ao adentrar na "arena" o pau rolava frouxo. Um goleiro era agarrado pela camisa e espancado por adversários. A sorte é que não tinha "torcedores". Na outra vez, que foi o causo que a história do Maurício me recordou, foi a primeira oportunidade que vi uma arma ser utilizada dentro de campo/quadra. Chegamos no lendário ginásio. Um jogo rolava na quadra, sem chamar a atenção. Ninguém na arquibancada, só nós e nossos adversários das 21 horas. Cumprimentos, guardar objetos, alongamento fajuto, etc. Aos poucos o jogo da quadra começou a nos chamar a atenção. Chegadas. Carrinhos sem bola. Chegadas mais ríspidas. Pontapés. Coices. Dentro da quadra, nem um pio de reclamação. Começamos a assistir com interesse, mesmo que não houvessem jogadas brilhantes. Não havíamos assistido o que acontecera antes, mas sentia-se no ar que era uma partida "diferente". Era muito "amor à camiseta", mesmo para parâmetros bajeenses.

Bem, a cena central foi simples mas não esqueci. Numa dessas, o jogador dos "com-camisa" domina uma bola no meio da quadra. Um dos "sem-camisa" (acho que na época não havia os coletes de hoje), chega por trás, e de uma passada só, levanta os dois pés do "com-camisa" do chão. Ouvimos o vôo e a queda. Ele mal caiu. Foi bater no chão e tipo "joão-bobo", levantou num pulo. Nessa de "cai-levanta", enfiou a mão na meia e sacou um canivete automático. "Relampeou" a lâmina, que não era pouca coisa. A assistência, imóvel. Perplexa, talvez.

Quando todos pensávamos que aquilo acabaria ali, no "saque", ocorre que o "com-camisa" e agora "com canivete", parte pra cima do cara que tinha dado a entrada nele. Cortava o ar com a gana de quem corta uma picanha depois de esperar 4 horas pelo churrasco. A sorte do "oponente", por incrível que pareça, é que ele não fugiu. Deu um, dois passos pra trás, mas calculados, sempre olhando a lâmina. Até que num ataque mais veemente do "com canivete", ele deu o último passo pra trás e no impulso chutou o braço que empunhava a arma. Não desarmou, mas desequilibrou, e nisso os próprios companheiros de time dele, o agarraram e desarmaram. A cena, além de inusitada (espero), revelou que nestas horas a gente mal reage. É tudo muito rápido e inacreditável.

Mas vejam como é o futebol: após a briga ser "apartada", faltando 10 minutos para terminar o jogo, e com os mais exaltados fora de quadra e a caminho de casa, em segurança, um dos jogadores do time do cara "do canivete" se aproxima de nós e pergunta:
“E aí gurizada, tá faltando um. Ninguém quer completar?...”

O ginásio do Flamengo faz parte da história futebolera de todos que viveram a infância e juventude em Bagé, sempre com um preço razoável, e já há algum tempo com um belo piso de parquet.

Foto: meramente ilustrativa, tirada do UOL esportes.

1 comentários:

Maurício Alejándro Kehrwald disse...

“E aí gurizada, tá faltando um. Ninguém quer completar?...”


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Uma das melhores histórias do ano!!!!!!!!!!!!!!

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Esse blog tá cada vez melhor.

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